Fernando Scheller - O Estado de S.Paulo
Após perder mercado, Avon corrige dificuldades logísticas
e moderniza produtos
"Foi um longo ano e meio." Com essas palavras,
no fim da entrevista que concedeu ao Estado durante sua mais recente visita ao
Brasil, a presidente mundial da Avon, Sheri McCoy, expressou as dificuldades
enfrentadas desde que assumiu o comando da gigante americana dos cosméticos, no
início de 2012.
Ela chegou num dos momentos mais difíceis da história da
empresa. Nos Estados Unidos, a companhia estava sendo investigada por
supostamente oferecer propinas no exterior, incluindo no Brasil. O mercado
brasileiro - o mais importante em vendas para a Avon - havia sofrido um "apagão"
logístico no fim de 2010.
A troca de sistemas internos da Avon causou uma confusão
nos pedidos entregues às revendedoras, que se viram em maus lençóis com as
clientes. Como resultado, um número considerável de representantes preferiu
deixar a marca. Tantas confusões em série levaram à saída da toda poderosa
Andrea Jung, que comandava o negócio havia mais de dez anos.
Dezoito meses após assumir o cargo, Sheri sabe que ainda
tem muito trabalho pela frente. E o resultado está transparente nos números da Avon.
Em 2012, o faturamento da companhia no Brasil cresceu 3% quando descontados os
efeitos da variação cambial, enquanto rivais como O Boticário viram a receita
saltar 25%. A Natura cresceu 13% no ano passado. Em dois anos, a Avon passou da
terceira para a quinta posição no mercado brasileiro. De 2009 para cá, sua
fatia do setor de beleza no País caiu de 9% para 7,2%.
A presidente mundial da Avon afirma que o jogo não pode
ser virado do dia para a noite, mas acredita que a companhia já tomou as
medidas adequadas para sair da retranca. Além de acertar o passo das entregas e
de renovar o pacto com as consultoras - oferecendo mais benefícios -, a Avon
está apostando em novidades segmentadas para o público brasileiro, abandonando
a estratégia de novidades globais que sempre pautou sua atuação. Agora, a
executiva diz que a companhia está pronta para voltar a ganhar mercado, mesmo
batendo de frente com uma concorrência mais robusta. Leia os principais
trechos:
A Avon tem buscado se adaptar para evitar a perda de mercado
no Brasil?
Sim, a nossa nova linha de maquiagem, lançada
mundialmente, ganhou desta vez cores que se adaptam às necessidades da
consumidora brasileira. Também lançamos uma linha chamada Avon Encanto (de
cuidados com a pele) que foi especificamente pensada para a brasileira. O time
local tem a missão de identificar as necessidades da consumidora para repassar
ao time global. Assim, conseguiremos oferecer os produtos certos no Brasil.
Mas, ao contrário do que fazem outras marcas globais,
como a Unilever, a Avon desenvolve poucos produtos no Brasil.
O mais importante não é onde o produto é feito, e sim se
estamos realmente conectados ao que a consumidora quer. Fazemos alguns produtos
aqui e também temos o cuidado de testá-los no País antes de colocá-los à venda.
A maioria dos relatórios de consultorias mostram que o Brasil será o segundo
maior mercado mundial de beleza em 2014, superando o Japão. Como presidente
global da Avon, tenho certeza de que o País é um mercado em que temos de
continuar a investir e a ser cada vez mais competitivos.
Em 2010, a Avon teve problemas sérios com a logística, o
que levou à perda de revendedoras. A empresa já conseguiu superar esse
problema?
O time brasileiro está muito focado na satisfação das
revendedoras. Participei de uma reunião com algumas de nossas principais
representantes. Tínhamos vendedoras recém-captadas e outras que estavam conosco
há 21 anos. Há sempre o que melhorar, mas acredito que tenhamos resolvido os
problemas do passado. Já voltamos a captar revendedoras.
A consumidora da Avon terá de esperar menos pelos
produtos?
Um dos problemas que enfrentamos em 2010 era que as
revendedoras não estavam recebendo os produtos certos. Agora, conseguimos nos
organizar para que os produtos corretos estejam nas caixas despachadas a elas.
Assim evitamos devoluções. Ao mesmo tempo, estamos mudando a linha de produtos.
A revendedora local sabe que os produtos da Avon são bons, mas ela está
exigindo produtos que realmente estejam em linha com o que a consumidora
brasileira quer.
A Avon perdeu terreno nos últimos anos quando se olha a
participação de mercado. Corrigir isso é importante?
Estávamos focados em garantir que o negócio rodasse corretamente. Mas o
objetivo final é ampliar a participação de mercado. Os problemas de serviço
comprometeram nossa posição. Também fomos prejudicados pelo fato de que, em
alguns casos, nosso produto não estava em linha com o desejo do consumidor
brasileiro.
A Avon é considerada uma marca popular, do ponto de vista
de preço. Isso deve mudar?
Preço é um fator importante, por dois motivos: se é muito
baixo, as pessoas vão pensar que o produto é de má qualidade; se é caro, pode
ficar fora do alcance. Ao lançarmos produtos com mais tecnologia, há a
oportunidade de reajustar os valores para aumentar nossas margens e deixar as
revendedoras mais satisfeitas, porque elas vão ganhar mais. Mas, pensando na
estratégia histórica, somos uma empresa para as massas. Continuaremos fiéis a
isso.
O México tem sido um mercado muito forte para a Avon,
enquanto o Brasil está enfrentando dificuldades. O que está dando certo no
México?
É muito difícil comparar os dois mercados, porque o Brasil teve problemas no
serviço. Por aqui, houve um período em que o foco foi a correção de problemas,
enquanto no México isso não ocorreu. Por isso, o resultado no mercado mexicano
foi mais consistente.
Os países emergentes estão ficando mais importantes para
o resultado global da Avon?
Sim. Quando se analisa as projeções da consultoria Euromonitor para o mercado
de beleza, o crescimento virá realmente dos mercados emergentes. A boa notícia
para a Avon é que, hoje, 75% das vendas vêm desses países. Nos países ricos, há
uma grande competição de outros canais, como varejo e online. Hoje, nosso foco
nos mercados maduros é mais na lucratividade.
A Natura, que é líder no setor de cosméticos no País,
também perdeu participação. Isso pode ser um sinal de que o mercado de vendas
diretas vem perdendo força?
A venda direta ainda é importante, tanto que um de nossos
concorrentes, O Boticário, também está migrando para o porta a porta. O que
estamos tentando fazer é nos aproximar do público usando meios digitais e redes
sociais.
A Avon atua no e-commerce em alguns de seus mercados.
Esta é uma possibilidade para o Brasil também?
Sim, vendemos pela internet, mas na maioria das vezes tentamos fazer isso por
meio das nossas revendedoras. Em lugares como a Rússia nós treinamos as
representantes para que elas criassem páginas no Facebook e vendessem online.
Isso é algo que vamos explorar em mercados como o Brasil.
Unilever e P&G cresceram muito no País nos últimos
anos. Está mais difícil vender no Brasil?
Sim. Mas tudo também depende da categoria que se analisa.
Procter e a Unilever estão focadas na área de cuidados com o cabelo. Nós somos
fortes em maquiagem e vamos manter essa posição, embora a L'Oréal também esteja
cobiçando este segmento. Vamos investir onde somos fortes: maquiagem,
fragrâncias e cuidados com a pele. Teremos oferta para cabelos, mas sem a
intenção de disputar a liderança com Procter e Unilever.
A Avon hoje tem o objetivo de crescer entre 5% e 10% ao
ano, mas o mercado de beleza cresce em mais do que isso nos mercados
emergentes. A empresa ainda vai levar um tempo para acompanhar o ritmo do resto
do mercado?
Nosso objetivo para os próximos quatro anos é crescer
perto de 10%. Ao longo do tempo, o objetivo passa a ser acompanhar o mercado.
Assim, não perderemos participação de mercado. Mas é uma questão de tempo e
precisamos ser realistas.
A Natura está abrindo lojas no Brasil. É possível que a
Avon tenha espaços físicos próprios, pelo menos para as mulheres testarem os
produtos?
Olhei várias lojas no shopping para checar o que nossos
competidores estão fazendo, tanto em farmácias quanto em unidades próprias. Houve
uma evolução visível no varejo brasileiro. Para nós, por enquanto, o foco está
em fazer com as nossas revendedoras. Mas podemos analisar outras opções no
futuro.
Fonte: Estadão