Empresa está apostando nas redes sociais
App também será lançado para impulsionar as vendas
Aplicativo disponível na Turquia, "Espelho Mágico", virá para o Brasil (Foto: Reprodução / Avon Turquia) |
Após perder 85% do seu valor de mercado em cinco anos, a
Avon está executando um plano de reestruturação mundial para tentar se
recuperar. Os primeiros passos já foram dados: a companhia separou as operações
da América do Norte em uma nova empresa, vendida em dezembro para o Cerberus,
famoso por investir em empresas em crise. Agora o foco é enxugar custos e
direcionar investimentos para países emergentes. Com isso, o Brasil, mercado
número um da Avon desde 2010, ganhará mais relevância.
"Estamos focados nas áreas certas e o Brasil é uma
delas", ressaltou a presidente mundial da Avon, Sheri McCoy, em entrevista
exclusiva ao jornal O Estado de S. Paulo na semana passada, durante
visita ao País. Removidos os resultados da América do Norte, o Brasil respondeu
por entre 20% e 25% da receita da Avon entre 2013 e 2015.
No processo de reestruturação, a empresa transferiu a
sede dos Estados Unidos para o Reino Unido, em busca de custos tributários mais
baixos e, com o intuito de alocar as divisões globais da companhia mais perto
dos principais mercados, mudou para o Brasil a base dos líderes mundiais de
quatro áreas - cuidados pessoais, da linha de maquiagem Color Trend,
fragrâncias femininas e masculinas. A ordem é apostar em marketing e na criação
de novas ferramentas que ajudem as revendedoras a fechar negócios nas redes
sociais.
O corte de despesas também é vital. Até 2018, a empresa
pretende reduzir US$ 350 milhões em custos anuais e eliminar 2,5 mil empregos
no mundo. Sheri não informou o total de demissões no Brasil, mas afirmou que é
uma "porção menor", focada nas áreas administrativas.
Desafio
Os números da Avon dão ideia do tamanho do desafio da
empresa. Desde 2012, a companhia divulga prejuízos líquidos, que somam US$ 1,8
bilhão até o primeiro trimestre deste ano, de acordo com a Economática. A
margem líquida está negativa. A receita está em queda, em parte por causa da
desvalorização das moedas emergentes em relação ao dólar. Mas, mesmo em real, a
empresa vendeu 7% menos no primeiro trimestre.
Fragilizada, a Avon se tornou alvo de investidores
ativistas, que compram participações minoritárias e depois pressionam a
companhia a fazer mudanças para melhorar o resultado. Em dezembro, o fundo
Barington Capital, dono de cerca de 3% da Avon, chegou a enviar uma carta ao
presidente do conselho da empresa na qual sugeriu uma reestruturação e a troca
de liderança da companhia.
Cerca de 15 dias depois, a Avon anunciou a operação com o
Cerberus. O fundo fez um aporte de US$ 605 milhões na empresa, em troca de 80%
da divisão da América do Norte e de uma fatia de 16% na Avon.
"Eles não conseguiram um bom retorno financeiro. O
valor da operação reflete os desafios da empresa", disse o analista do
banco UBS da área de bens de consumo, Stephen Powers. Em 2012, a multinacional
de cosméticos Coty chegou a fazer uma oferta de US$ 10 bilhões pela Avon, que
hoje vale menos de 20% da antiga proposta (cerca de US$ 1,68 bilhão).
O analista do UBS ressaltou, no entanto, que a venda da
divisão da América do Norte foi uma decisão correta, já que consumia muito
esforço de gestão e investimentos. Para ele, a marca não tem grande potencial
de crescimento nos EUA.
Em março, a Avon fez um acordo com o Barington e aceitou
que o fundo ativista indicasse um diretor independente para a empresa. O
presidente do Barington, James Mitorotonda, disse que, apesar de estar
"desapontado" com o valor da negociação com o Cerberus, vê a entrada
do fundo no negócio como positiva. "Nós já vimos significativas mudanças
no curto prazo após o investimento, incluindo um plano de redução de custos
expressivo e de realocação da sede da empresa", afirmou. Ele ressaltou, no
entanto, que espera que a companhia anuncie novas iniciativas de cortes de
custo e ganhos de receita.
Virada?
Sheri reconhece que a empresa errou, mas ressalta que
agora ela está no caminho correto. "Sim, nós tivemos momentos desafiadores
e eu acho que a divisão da América do Norte era parte do problema. Não
estivemos tão focados em algumas regiões e na necessidade de investir
nelas", afirmou.
No Brasil, enquanto a empresa americana sofria, os
concorrentes avançaram. Em 2010, a Avon era a terceira empresa no mercado
brasileiro de beleza e cuidados pessoais, com 8,8% de participação, atrás de
Natura e Unilever, segundo a Euromonitor. Em 2015, caiu para a sétima posição,
com fatia de 5,7%, superada por empresas como O Boticário e L'Oréal.
O analista da Euromonitor Guilherme Machado explicou que
a Avon perdeu espaço pelas mudanças de mercado e pelo aumento da competição.
"Com o avanço do varejo nas cidades médias, a capilaridade antes
exclusivamente alcançada pelas consultoras de vendas diretas foi uma vantagem
competitiva que perdeu sua força", disse.
Sheri reforçou que as mudanças já começaram e que a
empresa voltou a ganhar espaço no País em março - cerca de 1 ponto porcentual,
segundo dados da Nielsen. "Nós acreditamos realmente que a Avon está em um
momento de virada."
Quatro analistas consultados pelo jornal O Estado de
S. Paulo consideram acertada a decisão da empresa de investir no Brasil,
mesmo em tempos de crise, ressaltando que há oportunidades de longo prazo no
segmento. Alguns, como Powers, do UBS, até acharam os planos da Avon tímidos
por aqui. "Quando você olha o quanto a competição cresceu no Brasil e o
quanto a Avon ficou para trás, não estou convencido de que será
suficiente."
Redes sociais
Enquanto sua maior rival no Brasil, a Natura, inicia a
expansão no varejo, a Avon seguirá com foco nas vendas diretas, estratégia
usada desde sua fundação, há 130 anos. No seu plano de reestruturação, a Avon
quer transformar o "porta a porta" em uma venda digital.
"Eu sei que falar em vendas diretas parece
antiquado. Mas eu realmente acho que depende de como você pensa nisso",
afirmou a presidente mundial da Avon, Sheri McCoy. "Sempre foi um 'social
commerce' e existe uma grande oportunidade de usar a tecnologia para criar um
porta a porta contemporâneo."
A Avon vai investir em tecnologias para ajudar as consultoras
a vender. A empresa está criando um arsenal de marketing específico para elas
compartilharem no Facebook, Instagram ou Whatsapp. No próximo trimestre, a Avon
vai lançar no Brasil um novo sistema para as consultoras, que vai facilitar a
integração do conteúdo da Avon com o celular delas.
Na Turquia, as consultoras já tem um aplicativo, batizado
de "espelho mágico", que simula como fica a maquiagem na foto da
cliente. Esse app virá para o Brasil e vai ajudar as consultoras a vender,
disse Sheri.
A Avon também vai recorrer à ciência. "Temos 200
cientistas na área de desenvolvimento de produtos e 600 patentes, mas nunca
usamos isso no marketing", afirmou a vice-presidente de marketing da Avon,
Marise Barroso. Resultados de testes cegos com consumidor e detalhes sobre
inovação vão entrar no catálogo e nas campanhas para a televisão.
Lojas
Questionada se a empresa poderá seguir o caminho da
Natura e abrir lojas próprias, Sheri refutou a ideia. "Eu olhei as lojas e
me pareceu que é mais um espaço para experiência de marca do que para trazer
volume de vendas", disse. Ela insiste que recomendação de amigos é o
principal fator de escolha de um produto de beleza e que a venda direta dá esse
"toque pessoal" às vendas. "Não seria possível se nossas 6
milhões de consultoras estivessem em uma loja de departamentos."
Para o consultor Maximiliano Bavaresco, sócio-fundador da
Sonne Branding, a Avon está certa em apostar no avanço das vendas diretas nas
redes sociais. "É uma nova frente. Mas só a venda direta não atende todas
as consumidoras. O mercado é multicanal", disse. Ele lembrou que
concorrentes como O Boticário, Natura e L'Oréal vendem em diferentes canais.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.